A autorregulação é a capacidade do sistema nervoso central para atingir, manter e alterar o nível de arousal (ou nível de alerta) de um modo apropriado à situação ou atividade, e desenvolve-se a partir da nossa habilidade de equilibrar (regular ou modular) o input sensorial do ambiente.
Um estado de alerta ótimo permite prestar atenção aos estímulos importantes e ignorar os estímulos irrelevantes (p. ex. estar atento à professora na sala de aula e ignorar os ruídos, sons ou luzes), sendo essencial para o desenvolvimento da atenção nas tarefas, controlo dos impulsos, tolerância à frustação e equilíbrio das reações emocionais.
O nosso estado de alerta varia ao longo do dia e todos usamos diversas estratégias para o regular, tendo em consideração o efeito que diferentes sensações podem ter no nosso sistema nervoso (excitatório ou relaxante).
PROCESSAMENTO SENSORIAL
O processamento sensorial é a forma como o sistema nervoso central gere a informação sensorial, incluindo a deteção, modulação, discriminação, integração e organização dos estímulos sensoriais, bem como, as respostas comportamentais aos inputs sensoriais.
A deteção (registo da informação sensorial), ajuste e organização das reações aos estímulos (modulação) e a perceção dos detalhes das sensações (discriminação) são componentes essenciais do processamento sensorial que permitem que a pessoa possa agir e interagir no meio. O registo e a modulação sensorial são melhor observados através dos seus efeitos no comportamento, emoção, motivação e atenção.
É difícil desenvolver estratégias para mudar os níveis de alerta quando a criança não responde apropriadamente à informação sensorial, uma vez que são diretamente afetadas pela reatividade ao estímulo sensorial.
O QUE É A MODULAÇÃO SENSORIAL?
Refere-se à regulação que o sistema nervoso faz da sua própria atividade, ou seja, a capacidade de ajustar e organizar reações à intensidade e duração dos estímulos. Ocorre em todos os sistemas sensoriais (visão, audição, olfato, paladar, tátil, vestibular e propriocetivo) e contribui para a regulação da intensidade da resposta a uma ou várias sensações, adaptação a variações nos estímulos ambientais, atenção adequada e capacidade de autorregulação (controle emocional e comportamental). A capacidade de organizar as sensações recebidas e produzir respostas adaptativas reguladas é fundamental para que consigamos ser funcionais na nossa rotina diária (autocuidados, brincar, trabalho) e interações sociais.
ALTERAÇÕES NA MODULAÇÃO SENSORIAL
Surge quando há dificuldade em regular respostas aos inputs sensoriais resultando em evitamento ou respostas negativas a sensações que não costumam incomodar os outros.
A reatividade sensorial (hiper ou hiporreatividade) pode ser acompanhada por uma resposta extrema de procura sensorial ou comportamentos de evitamento os quais podem ser prejudiciais para a aprendizagem e interação social.
Sinais de alerta:
- Dificuldade em produzir uma resposta típica à sensação;
- Lento para responder ou inconsciente da sensação;
- Reação exagerada a sensações usuais;
- Procura excessiva de determinadas sensações;
- Flutuação de respostas à sensação;
- Hesitante ou resposta de evitamento;
- Nível de atividade alto ou baixo;
- Dificuldade de atenção;
- Pobre controlo do impulso;
- Baixa tolerância à frustração;
- Flutuação nas reações emocionais;
- Evitamento de tarefas da vida diária;
- Ansiedade e sobrecarga em ambientes mais confusos.
HIPERRESPONSIVIDADE SENSORIAL
Refere-se à sensibilidade exagerada (hipersensibilidade) ao input sensorial de um ou vários sistemas sensoriais. A criança tem um comportamento de defesa, associado frequentemente a uma forte emoção negativa e com ativação do sistema nervoso simpático. Algumas crianças podem ficar muito agitadas, negativas, impulsivas e agressivas, por outro lado, outras podem afastar-se para evitar as sensações.
Comportamentos frequentes:
- Facilmente distraído por barulhos de fundo;
- Excessivamente sensível a sons;
- Facilmente distraído pelos estímulos visuais;
- Aversão a cheiros, paladares e texturas dos alimentos;
- Insegurança gravitacional – reage negativamente ou com medo a experiências de movimento, particularmente as que envolvem uma alteração da posição da cabeça e movimentos para trás ou para cima no espaço (p. ex. medo excessivo de alturas; no parque não usa equipamentos como o baloiço ou o escorrega; medo em superfícies instáveis; ansiedade quando os pés não tocam no solo);
- Defesa tátil – reação negativa às sensações táteis (p. ex. evita roupas com determinadas texturas e prefere peças de roupa específicas; evita o contacto físico com os outros e não gosta do toque leve ou inesperado; dificuldade a explorar materiais com diferentes texturas; não gosta de lavar, pentear ou escovar o cabelo; não gosta de lavar ou limpar a cara ou o corpo; recusa-se a usar pasta dos dentes; não gosta de cortar as unhas; evita comidas com determinadas texturas).
HIPORRESPONSIVIDADE SENSORIAL
Nestes casos, há uma consciência limitada da sensação, levando a um comportamento diminuído ou ausência de resposta ao estímulo sensorial. Apresenta poucos comportamentos exploratórios devido à baixa iniciativa e pobres capacidades discriminativas. Procura ativamente input sensorial e as suas necessidades sensoriais interferem com a capacidade de manter-se concentrado em atividades sedentárias e na manutenção do estado de alerta. Estas crianças podem ser descritas como distraídas, passivas, com pouca energia e agindo como se estivessem cansadas, desinteressadas e difíceis de integrar e socializar.
Comportamentos frequentes:
- Pouca sensibilidade à dor;
- Não limpa a saliva ou os restos de comida;
- Parece não ter a consciência de usar a sanita;
- Aprecia sensações que podem ser dolorosas (p. ex. atirar-se para o chão, bater no seu próprio corpo);
- Não nota quando a roupa fica torcida no corpo;
- Parece não dar conta ou ignorar odores fortes;
- Caminha de encontro a objetos e pessoas como se não estivessem lá;
- Parece não ter a consciência de ser tocado por outro;
- Parece não ouvir certos sons;
- Descoordenada e com pouco equilíbrio;
- Cansa-se facilmente fisicamente.
AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO
A avaliação de uma perturbação da modulação sensorial é feita pelo terapeuta ocupacional especialista em integração sensorial. Só uma avaliação qualificada permitirá avaliar os sistemas sensoriais e compreender o perfil sensorial de cada criança, permitindo um raciocínio clínico eficaz na interpretação das suas necessidades sensoriais e possíveis alterações no seu comportamento e capacidade de autorregulação.