Hábitos orais na infância consiste num padrão repetitivo de comportamento que envolve a cavidade oral, com ação realizada pela musculatura intra e peri-oral, estando diretamente relacionado com as funções do sistema estomatognático (sucção, respiração, deglutição, mastigação e fala). É um ato neuromuscular de natureza complexa, caracterizando-se por ser um estímulo aprendido que se torna inconsciente. Iniciam-se por vários fatores etiológicos (orgânicos e/ou emocionais), sendo comummente observados na infância.
Dividem-se entre hábitos de sucção nutritiva e não nutritiva. Os primeiros referem-se ao hábito que faculta nutrientes essenciais ao indivíduo (sucção do seio materno ou do biberão nos primeiros meses de vida), e os segundos dizem respeito aos hábitos que promovem a sensação de bem-estar.
Os hábitos orais são inicialmente de índole prazerosa, proporcionando uma sensação de aconchego, segurança e felicidade. A sua prática é interrompida, em maioria, até aos 3 anos de idade não tendo efeitos nocivos no desenvolvimento. No entanto, quando os hábitos persistem, podem ter impacto negativo no desenvolvimento orofacial da criança, assumindo implicações na saúde oral, na saúde geral e na qualidade de vida.
Hábitos orais e o desenvolvimento orofacial
A determinação do grau de implicação que um hábito oral tem no desenvolvimento orofacial da criança é determinada pelo tipo de hábito, a duração (meses ou anos), a sua intensidade (força utilizada), frequência (quantas vezes por dia a criança pratica o hábito), a predisposição individual e a idade da criança.
São considerados hábitos orais nocivos:
- Sucção digital do dedo (chuchar no dedo);
- Sucção labial e/ou lingual;
- Sucção de objetos;
- Uso da chupeta;
- Uso prolongado de biberão;
- Onicofagia (roer as unhas);
- Bruxismo (ranger os dentes);
- Morder a língua, bochechas, lábios ou objetos.
Na prática clínica, observa-se que o uso do biberão e da chupeta, bem como, a sucção digital, são umas das causas mais frequentes de problemas orofaciais nas crianças, provocando alterações nas estruturas oclusivas/dentárias, ósseas e musculares, devido à existência de um objeto que proporciona uma intensidade, frequência e duração de pressão inadequada.
Consequências dos hábitos orais
Comprometem o desenvolvimento harmonioso das estruturas orofaciais da criança e, consequentemente, poderão gerar alterações nas ações de sucção, deglutição, mastigação, respiração e fala, nomeadamente:
- Pressões atípicas inadequadas;
- Flacidez de órgãos fonoarticulatórios (lábios, bochechas, língua, véu palatino);
- Alteração morfológica;
- Atresias, hipoplasias;
- Alterações no desenvolvimento e posição dos dentes e de oclusão (mordida aberta anterior, aumento do overjet e mordida cruzada posterior);
- Desiquilíbrio nas funções do Sistema Estomatognático:
- Alterações nos movimentos necessários para mastigar e engolir os alimentos;
- Hipertensão da musculatura mastigatória;
- Alterações ao nível da respiração (padrão de respiração oral);
- Problemas na articulação dos sons da fala.
A maioria das perturbações da fala diagnosticadas estão diretamente relacionadas com a presença de hábitos orais pelo facto de provocarem alterações na motricidade orofacial (modificação da posição da língua, alterações da oclusão dentária, perda de tonicidade nas estruturas orais).
Sinais de alerta
Salientam-se alguns comportamentos visíveis decorrentes da presença de hábitos orais nocivos que urgem de avaliação especializada:
- Dificuldade em fechar os lábios;
- Dificuldade na respiração, mantendo uma respiração exclusiva pela boca ou boca e nariz;
- Frequentemente de boca aberta;
- Presença de olheiras;
- Presença de roncopatia (ressonar);
- Colocação da língua em posição baixa e anteriorizada;
- Tem mais de um ano de idade e ainda não consome alimentos com maior consistência;
- Come devagar ou demasiado rápido;
- Dificuldade nos movimentos mastigatórios (por exemplo, movimentos apenas verticais ou mastiga só de um lado);
- Alterações na fala – dificuldade de produção articulatória dos sons.
Avaliação e Intervenção
Recomenda-se que os hábitos orais sejam eliminados até os 3 anos de idade, para diminuir os impactos negativos nas estruturas orofaciais e das funções do sistema estomatognático da criança. A prevenção é a melhor forma de impedir a implementação de um hábito oral nocivo, porém aquando da sua instalação poderá ser necessário a avaliação de uma equipa multidisciplinar – dentistas, ortodontistas, terapeutas da fala, psicólogos, entre outros – que permita identificar o impacto que o hábito oral tem na qualidade de vida da criança.
Em terapia da fala, é realizada a avaliação miofuncional das estruturas orais – sensibilidade, mobilidade, força, postura, função e estética – e a reabilitação através de técnicas que permitam reduzir inadequações musculares, funcionais e oclusais através do treino da postura, movimento funcional e normalização sensorial. A intervenção debruça-se também na sinalização do hábito oral e análise do mesmo para definição de estratégias que permitam a sua redução quotidiana, orientação e aconselhamento para os pais/cuidadores.